AGOSTO LILÁS

METADE DO BRASIL ESTÁ EM PERIGO

Metade do Brasil está em perigo

Por Erika Bismarchi

Seria um exagero se eu dissesse que quase metade da população brasileira está em risco? 

No último levantamento a domicílio, realizado pelo IBGE, foi cadastrado um pouco mais de 203 milhões de residentes aqui no Brasil. Mais da metade dessa gente é formada por mulheres, mais de 103 milhões, que representam 51,5% desse total. Isso significa que existem em torno de 6 milhões de mulheres a mais do que homens no nosso país. 

Levando em conta esses e com alguns outros dados conseguimos responder (ou ter uma ideia) à essa pergunta. 

Dados da 10ª Pesquisa Nacional de Violência contra a Mulher apontam que quase 30 milhões de mulheres – cerca de 30% – declararam que já sofreram algum tipo de violência doméstica ou familiar provocada por um homem, e que 67% eram maridos, namorados ou companheiros, no período da agressão. No entanto, dez mulheres em cada seis revelaram conhecer, pelo menos, alguma amiga, vizinha ou parente que já sofreu alguma ofensa por parte de algum homem próximo e em um local de âmbito privado.

Sendo assim, já é possível reparar como tratar do assunto é complexo, e, como é grave a realidade quando mostrada através de números. De pronto, já podemos concluir que os que são registrados não representam a conjuntura do problema em sua totalidade.

Segundo informações retiradas do Mapa Nacional da Violência de Gênero, 61% das ‘mulheres, o que daria aproximadamente 50 milhões, que sofreram com algum tipo de violência, em 2023, não foram à delegacia e não registraram queixa. Nessa reflexão, levaremos em conta as outras tantas que nem aparecem nessa porcentagem, as que estão escondidas no silêncio de suas vidas domésticas, aquelas que vivenciam e suportam caladas, sem despertar a desconfiança de ninguém. 

Assim, não é exagero afirmar que praticamente metade da nossa população está em risco, inclusive de morte. Afinal, se somadas as violências que foram notificadas com as subnotificadas – mas que são encontradas em alguns relatórios – podemos calcular que mais de 80 milhões de mulheres foram vítimas de violência doméstica e familiar no ano passado. Mas se quisermos ir além, e colocarmos os aqueles que não foram oficializados, mas que sabemos que existem, qual seria o resultado? É assustador quando analisado desse jeito. Mas, por que existem tantas mulheres sofrendo violência doméstica?

Os motivos são muitos: começaremos com o patriarcado, que é a raiz de toda a questão. Em muitos casos, o uso da impetuosidade aparece como forma de controle tanto do corpo quanto dos comportamentos femininos. A cultura do machismo, que é uma expressão do patriarcado, contribui para a normalização da naturalização da violência, que faz com que vítimas não sejam capazes deedentificá-las.

A esperança na promessa de mudança nas atitudes do agressor; a vergonha em pedir ajuda, em se expor; a preocupação com os filhos, que é pautada, principalmente, na ideia da família tradicional; a dependência financeira, já que muitas têm seus salários retidos, outras são proibidas de estudar e trabalhar; o medo – dele, do incógnito, de morrer; a crença da falta de punição por parte dos dirigentes e Estado; a falta de conhecimento em relação à legislação e aos seus direitos são alguns 

No ano passado, foram registrados na Base Nacional de Dados do Poder Judiciário (Datajud) 813 mil processos judiciais de crimes de violência doméstica e familiar contra à mulher. Só nos cinco primeiros meses de 2024 foram documentados mais de 380 mil boletins de ocorrência. Isso equivale a uma média de 2,5 mil por dia em todo o país. Foram 318,5 mil acusações de violência doméstica, 57 mil casos de estupro e um pouco mais de 5,2 mil de feminicídios. 

O Anuário Brasileiro de Segurança Pública nota a ascensão das ações violentas praticadas contra mulheres ano após ano. No ano de 2023, em relação a 2022, o aumento foi de 13% de ocorrências protocoladas no judiciário. No ano de 2022 houve uma alta de 11% em comparação ao ano anterior. Os dados compartilhados, pelo Datajud, até maio deste ano confirmam essa tendência: já foram notificadas 318,5 episódios de violência doméstica, sendo 57 mil de estupro e um pouco mais de 5 mil de feminicídios.

Assim como é possível perceber essa subida exponencial, nos registros da justiça brasileira, a cada ano que passa, se torna presumível reconhecer fatos, circunstâncias e épocas que provocam um salto nas querelas: dias de partidas de futebol, finais de semanas, feriados prolongados, festas de final de ano e nos meses de agosto e setembro, por exemplo, são alguns deles.

Fatores como ciúmes, separação, divórcio, gravidez e pós-parto, dificuldade financeira, desemprego, que podem ser pretextos de estresse, podem desencadear conflitos violentos. Algumas famílias quando passam um certo tempo em convívio podem ter suas tensões intensificadas que podem gerar desavenças que levem à violências. Placares negativos de grandes eventos esportivos podem estar associados a condutas descontroladas de agressão, principalmente se essa frustração estiver relacionada com o uso de álcool e outras substâncias psicoativas.

Nos meses de agosto e setembro houve uma crescente nas acusações de violência doméstica, como também houve uma elevação nos pedidos de medidas protetivas de urgência. A alta de notificações nesses meses pode ser atribuída às realizações de campanhas do ‘Agosto Lilás’, que são promovidas pela maioria dos municípios brasileiros, envolvendo diferentes  governos, diferentes instituições e população de forma geral.

Você sabe a origem do Agosto Lilás?

A primeira ação do ‘Agosto Lilás’ aconteceu em 2016, no Mato Grosso do Sul. Ano em que a  Lei 4.969/16 foi instituída. Ela formaliza o oitavo mês do ano como um período dedicado à conscientização e combate à violência doméstica e familiar contra as mulheres em todo território brasileiro. 

A cor lilás foi definida por estar fazer uma analogia aos movimentos feministas e às lutas das mulheres por direitos – adotado pelas sufragistas inglesas, em 1908, na mobilização pelo direito ao voto. O mês escolhido não foi à toa: É em agosto, mais especificamente no dia 7, que se comemora o aniversário da que é considerada a terceira melhor norma de combate e proteção à violência contra a mulher do mundo, pela Organização das Nações Unidas (ONU), por sua abrangência, a Lei 11.340/06, conhecida como ‘Maria da Penha’ – que neste ano completou a maioridade. 

O ‘Agosto Lilás’ pressiona os governos brasileiros, os estaduais e municipais, e organizações e instituições de diferentes setores a promover, anualmente, uma série de campanhas educativas, debates e palestras sobre a temática em escolas, comunidades e órgãos públicos, com o intuito de sensibilizar a sociedade sobre a importância da prevenção e incentivar a denúncia.

Cada vez mais, a iniciativa tem dado visibilidade ao problema da violência doméstica e familiar contra às mulheres, de modo a colocar o tema na agenda pública, o que ajuda a colaborar na pressão à implementação e ao fortalecimento de políticas públicas e ao aprimoramento de leis. Dessa forma, influencia a criação de novas delegacias especializadas, centros de apoio às vítimas e seus dependentes, capacitação dos profissionais que atuam diretamente com esse público, além da própria mudança social, que pode ser notada na abertura de novas acusações.

Oferecer informações sobre a Lei 14.340/06, sobre os direitos das mulheres, dispor de possibilidades de acolhimento e proteção, impacta diretamente a vida das brasileiras. Embora os esforços coletivos em ações preventivas de formação e educação, e maior acessibilidade de acesso aos serviços, sejam reconhecidos, ainda são muitas mulheres que desconhecem as atribuições que a “Maria da Penha” assegura.Conforme publicado na Pesquisa Nacional de Violência Contra a Mulher, apenas 20% dizem conhecer o teor da legislação. Essa ignorância individual – junto com a indiferença social por esse elemento – pode persistir nesse cenário e de bestialidade e feminicídio. 

A Lei exige aos municípios e gestores que amparem a vítima nas diferentes esferas e que as encaminhem à suporte jurídico, benefícios sociais, psicoterapias e profilaxias – em situação de violência sexual. Ademais, ela não se limita apenas a punição do agressor. Inclusive, nela está descrita uma série de determinações, que vão desde à garantia de proteção, suporte jurídico, assistência social e psicológica às vítimas, e, se houver, aos seus dependentes, e, estabelece as medidas protetivas de urgência – que prevê o afastamento do réu e inclui as palestras educativas e de ressocialização.

A Lei 14.340/06, também chamada de Maria da Penha

Há quem ache que violência é apenas porrada e safanão, mas não. A violência física é o que fica visível aos olhos. Existem distintas violências e muitas formas de praticá-las, podendo ser sutis, brutas e fatais. Elas costumam deixar hematomas, cortes, cicatrizes, marcas e traumas – desde os que são curados em poucos dias, com uso de gelo e ataduras, aos que, com muita sorte, podem ser tratados em anos de terapia.

A Lei é extensa, justamente por englobar diversas camadas e pontos fundamentais. Além de trazer as violências tipificadas e detalhadas e as regras definidas e limitadas no que concerne às medidas protetivas, ela orienta os suportes institucionais e as intenções educacionais e de prevenção. 

De acordo com o 5º artigo, violência doméstica e familiar contra a mulher é “qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial” e que pode acontecer em “âmbito doméstico, da família e de qualquer relação íntima de afeto”.

Os tipos de violências:

  • Física: entendida por qualquer ato que lesione a integridade ou saúde corporal. Pode partir de chutes, socos, tapas, empurrões, beliscões, puxões de cabelo;
  • Psicológica: considerada qualquer forma de comportamento que controle as maneiras e modos ocasionando o comprometimento do psicológico, da autoestima ou do pleno desenvolvimento, como o isolamento ou violação da intimidade. Ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, ridicularização, insulto, chantagem, exploração, são condutas previstas no artigo 7;
  • Sexual: qualquer forma de ameaça ou coação que intimide a vítima a presenciar e/ou participar de uma ou mais relações sexuais não desejadas, bem como induzir ou forçar a vítima ao matrimônio, à gravidez, ao aborto, à prostituição ou que impeça o uso de qualquer contraceptivo ou dos direitos sexuais e reprodutivos;
  • Patrimonial: qualquer forma de retenção, subtração ou destruição de algum ou todos objetos pessoais, instrumentos de trabalho, documentos, bens, valores, salários, heranças ou recursos econômicos;
  • Moral: qualquer forma de abuso que configure calúnia, injúria e difamação. 

Todos os indicadores de violência doméstica tiveram um crescimento, no ano passado se comparado a 2022, conforme o Anuário de 2023 foram 245,7 mil agressões (2,9%), 613,5 mil ameaças (7,2%), 899,4 mil chamadas ao 190 (8,7%). 

O apoio multidisciplinar:

É assegurado pela Lei 11.340/06 a saúde, a assistência social e psicológica, o atendimento policial e o auxílio jurídico à vítima. Do 10º ao 17º artigos há uma série de instruções e procedimentos burocráticos no tocante ao boletim de ocorrência, que vão à identificação do autor, ao corpo de delito, além de garantir a criação de juizados especializados e com competências para tratar de assuntos cíveis e criminais relacionados à violência doméstica. 

As medidas protetivas de urgência:

A medida protetiva de urgência é uma ferramenta de intervenção jurídica eficaz para proteger e garantir a segurança da vítima de forma imediata. Em outras palavras, ela pode salvar vidas. Nos termos fica acordado, no artigo 18, que o juiz deve dar um parecer à medida no prazo de 48 horas após a denúncia. Com base nos registros da Avaliação sobre a aplicação das Medidas Protetivas de Urgência da Lei Maria da Penha, cerca de 70% das cumprem o prazo. 

Em concordância com as apurações do Anuário, da Avaliação e do Mapa Nacional, entre os anos 2021, 2022 e 2023, foram requisitadas por volta de 1,5 milhão de medidas protetivas. Só no ano passado foram 530 mil pedidos. Acredita-se que apenas sete em cada dez vítimas solicitaram a proteção – por puro desconhecimento. 

A medida protetiva de urgência, com base na Lei Maria da Penha, deve ser requerida pela vítima na delegacia, preferencialmente nas especializadas de atendimento à mulher, na execução do boletim de ocorrência. A autoridade policial encaminhará a solicitação ao juiz responsável. Se concedida, o denunciado será intimado ou notificado por algum encarregado judicial.

Ele será afastado do lar, e será proibido de qualquer aproximação da vítima, incluindo de seus familiares e testemunhas – contando com a restrição de visitas aos dependentes menores. Também há o impedimento de frequentar os mesmos locais onde a ofendida está, e, se o investigado possuir posse de arma, ela será suspensa e suas armas recolhidas. O apurado deve participar de programas de recuperação e reeducação, como realizar acompanhamento psicossocial. 

Ainda em relação às medidas protetivas de urgência, a vítima deverá ser encaminhada a serviços de proteção, como casas de apoio, concessões de moradia, cesta básica, vaga em escola, entre outros. Se houver alguma procuração conferida da ofendida ao réu, ela se torna inválida e há o embargo temporário para celebração de atos e de contratos de compra, venda e locação. Em situação de subtração de algum bem por perdas e/ou danos materiais decorrentes da violência doméstica, a vítima deverá ser restituída.

Após a decisão judicial, o descumprimento das medidas pode acarretar a pena de detenção de três meses a dois anos – artigo 24. Lembrando que o juiz, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação policial, pode decretar a prisão preventiva do requerido a qualquer momento do curso dos autos. A medida não tem prazo de validade, podendo durar o prazo que a ofendida sentir que a sua integridade física, psicológica, sexual, patrimonial, ou moral está em risco. No entanto, se verificada a falta de motivo, a qualquer momento, por determinação judicial, ela pode ser revogada. 

A educação e prevenção: 

Além das classificações e diretrizes, a Lei estabelece a realização de programas e campanhas educativas que visem evitar e diminuir a violência doméstica e de gênero, como o ‘Agosto Lilás’ e o ‘Maria da Penha vai à escola’.  

Com vocês, a Maria da Penha

Antes da Lei 14.340/06, casos de violência doméstica e familiar contra à mulher eram tratados como crimes de menor potencial ofensivo, fazendo com que fossem destinados a serem julgados como infrações de menor gravidade. As penas, quando aplicadas, eram geralmente alternativas, como prestação de serviços comunitários, não refletindo a gravidade da questão. 

A biografia de relacionamento de Maria da Penha Maia Fernandes faz um paralelo com a história do país e dos direitos das mulheres, que nos oferecem respostas do por que quase metade da nossa população está em risco. 

Em 1976, ano em que Ângela Diniz foi morta por seu namorado Raul Fernando do Amaral Street – que foi amparado pela tese de legítima defesa da honra, Maria da Penha e Marco Antonio Heredia Viveros decidiram pelo matrimônio. Quando casaram, o casamento no Brasil era indissolúvel e o marido era considerado o chefe da família e exercia o “pátrio poder” – essa ideia vigorou no Código Civil de 1917 até 2002. 

Após um ano de casados, com o nascimento da primeira filha do casal, Marco Antonio se tornou intolerante, nervoso e que explodia facilmente, tanto com Maria da Penha quanto com as filhas. Elas aguentaram aproximadamente seis anos o ciclo da violência: a tensão diária, as ameaças, a explosão, o pavor, o arrependimento, as desculpas, os carinhos. Nesse meio tempo, ela deu à luz a mais duas meninas. Três no total.

Até o início dos anos 80, espaços que abordavam temas como as discriminações e violências praticadas contra mulheres eram inexistentes. Em 1983, com quatro anos de atraso, foi aprovada e ratificada no ano seguinte a Convenção de Eliminação de Discriminação contra a Mulher, que havia sido adotada pela Assembléia das Nações Unidas em 79. Em maio de 1983, Maria estava com 38 anos e as crianças tinham idades entre dois e seis. Em uma noite aparentemente comum, Marco deu um tiro em suas costas, enquanto ela dormia.

Em decorrência do disparo, Maria da Penha teve lesões irreversíveis na terceira e quarta vértebras torácicas, laceração na meninge externa, que envolve o cérebro e a medula espinhal, chamada dura-máter e dano em um terço da medula esquerda, o que resultou em sua paraplegia. Em setembro do mesmo ano, após voltar para casa, depois de ter sido submetida a duas cirurgias, diversas internações e tratamentos, ele a manteve por quinze dias em cárcere privado, dificultando qualquer contato com familiares e amigos, e tentou eletrocutá-la enquanto ela tomava banho. 

Quando a família e amigos de Maria da Penha souberam da grave condição dela e das filhas providenciaram apoio jurídico para que elas saíssem de casa sem configurar abandono de lar, o que poderia colocar a guarda das meninas em risco. O desquite e o divórcio, mesmo que liberados e permitidos pela legislação da época, era um feito náo comente de bravura, mas de desespero, pois ela sabia que a sociedade não via com bons olhos a mulher “desquitada” – expressão que só foi substituída, em 1989, por “separada”, justamente por conta do grande preconceito na palavra antiga.  

Como se não bastasse todas os traumas psicológicos e as consequências físicas, consequentes das duas tentativas de homicídio, Maria da Penha seria fortemente violentada mais uma vez: agora, seu algoz seria o Poder Judiciário – instituição que tem a função de zelar pelos direitos fundamentais individuais, coletivos e sociais e solucionar conflitos entre pessoas e Estado(s). 

O litígio de Maria da Penha arrastou-se por anos dentro dos tribunais, e, só depois de oito anos do crime, em 1991, aconteceu o primeiro julgamento de Marco Antonio. Ele foi condenado a 15 anos de prisão, mas a defesa dele pediu apelação de recurso e ele saiu pela porta da frente do fórum em liberdade. Mesmo fragilizada, ela continuou a buscar justiça. A segunda sentença foi de 10 anos e seis meses, em 1996. Mais uma vez, sob a alegação de irregularidades processuais por parte dos advogados de defesa, Marco ficou impune. 

Só em 1998, que o Centro para a Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Comitê Latino-americano e do Caribe para a Defesa dos Direitos da Mulher (CLADEM), em conjunto com a própria Maria da Penha, apelaram para a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (CIDH/OEA). . 

Após receber quatro ofícios da CIDH/OEA, dos quais não foram contestados, o Brasil foi responsabilizado por negligência, omissão e tolerância em relação à violência doméstica praticada contra as mulheres brasileiras. E, foi desse jeito, que o Estado precisava modificar a atuação diante dessas ocorrências com urgência, como instaurar jeitos de oferecer recursos rápidos e efetivos, como capacitação dos locais e profissionais, simplificação dos processos e planos pedagógicos, a fim de educar a sociedade no que diz respeito aos direitos das mulheres.  

Um Consórcio de ONGs Feministas foi criado para a elaboração de uma lei de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Depois de quatro anos, no dia 7 de agosto de 2006, a Lei 11.340 foi sancionada e ficou conhecida como Lei Maria da Penha. 

Outras Marias

Embora reconheçamos as contribuições que a Maria da Penha Maia Fernandes e os avanços que a Lei que leva seu nome trouxe, principalmente ao direito às mulheres, é preciso encarar que ainda existem centenas de milhares de Marias espalhadas pelo território nacional. O Brasil ocupa um dos piores lugares neste mundo no quesito.

Outro problema, apontado pela Avaliação sobre a aplicação das Medidas Protetivas de Urgência da Lei Maria da Penha é ao que se refere a produção de informações mais acessíveis e de melhor qualidade, pois isso facilitaria a fiscalização e os parâmetros da implementação da Lei Maria da Penha de forma mais efetiva, com o objetivo de subsidiar a formulação de políticas públicas baseadas em melhores evidências. 

Não é só sobre a questão das subnotificações que estamos falando, mas de quem são essas pessoas – tanto as vítimas quanto os averiguados. Mesmo sabendo que a violência contra as mulheres é extremamente democrática, por não escolher raça, classe social e idade, as nuances das distintas vidas, são principios que podem ser motivadores ou não e saber suas identidades, onde moram, quanto ganham, qual é a idade, escolaridade, é algo extremamente importante. Só assim se torna palpável a produção de soluções capazes de minimizar a condição de risco dessa parcela brasileira.

Sabemos que a maioria dos acusados são do sexo masculino – cerca de 85%, e, que das vítimas são mulheres, mais de 90%, entre 20 e 39 anos. A Pesquisa Nacional de Violência Contra a Mulher mostra que, entre elas, 64% recebem mais de seis salários e 79% até dois salários mínimos. Ou seja, quanto menor a renda mais chances de sofrerem com a violência doméstica. Em comparação com o perfil que se verifica para as mulheres, encontra-se um quantitativo menor para qualificar quem comete a agressão.  

Contudo, não basta deixar a responsabilidade do combate e prevenção da violência contra à mulher apenas na mão do poder público. A sociedade tem o dever de se sensibilizar, de se conscientizar e de entender que, mais do que apontar o dedo, é necessário estender as mãos às vítimas, e, se colocar lado a lado nessa luta, que não é apenas das mulheres, mas sim de todos nós. Só assim, conseguiremos combater o perigo que coloca as mulheres brasileiras em risco, ou seja, quase metade da população. 

 

Se você estiver sofrendo algum tipo de violência doméstica, disque 180. Você também pode acionar a Polícia no 190. 

Referências:
Agência Brasil Conselho Nacional de Justiça DataSenado Fórum Brasileiro de Segurança Pública  IBGE Instituto Maria da Penha Instituto Patrícia Galvão Observatório da Mulher Contra a Violência

 

Mestre em Políticas Sociais.
Formada em Comunicação Social&  Serviço Social.
Autora dos livros ‘Luxuosa Luxúria’, ‘Gabrielas, Marias e Amélias’ e ‘Domesticadas

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